Como forma de celebrar o aniversário de 40 anos de Beyoncé, o Kolibli teve a ideia de homenageá-la relembrando e ranqueando todos os seus álbuns de estúdio (sem contar os projetos com as Destiny’s Child, mas com a trilha sonora “The Gift” e o colaborativo “Everything is Love”). Entretanto, a tarefa se mostrou muito mais complicada do que o imaginado – e de certa forma, até ingrata.
O motivo é evidente: quando o assunto é Beyoncé, o único consenso que existe é sobre a importância dela para a música pop. A texana é um dos raros casos de união entre sucesso popular, respeito pela comunidade artística e aclamação crítica, figurando hoje como uma das cantoras que mais vendeu álbuns e singles na história, a maior vencedora do Grammy Awards (28 gramofones) e dona de uma nota média de 77/100 no agregador de resenhas Metacritic.
No currículo de Beyoncé, também é importante destacar o amor dela pelo videoclipe (formato que dominou e revolucionou). Com mais de 70 produções deste tipo, álbuns visuais e documentários, a cantora se tornou a maior vencedora na história do MTV Video Music Awards (com 28 prêmios, sendo dois por Vídeo do Ano), levou dois Grammys por Best Music Video e outro por Best Music Film (por conta do longa “Homecoming”).
Estamos analisando pouca coisa hoje, né? O Kolibli aceitou os riscos de mexer nesse vespeiro (ou melhor, colmeia) e agora apresenta a vocês uma retrospectiva com todos os CDs de Beyoncé, do não tão bom ao melhor.
Ranqueando os oito álbuns da Beyoncé (do pior ao melhor)
Escala de avaliações: péssimo < ruim < mediano < bom < excelente < clássico
8° “Everything is Love”, 2018
Até dói colocar um álbum bem produzido como o “Everything Is Love” nesta posição, mas ele é a exata representação da frase “não fede, nem cheira”. Após grandes projetos individuais de Beyoncé e Jay Z (“Lemonade” e “4:44”), as expectativas eram altas, mas o resultado é um álbum que existe apenas como demonstração de poder do casal. É uma ouvida confortável (até pela curta duração), mas nada além disso.
Com a exceção do hit “Apeshit” e o orgulho racial em “Black Effect”, o resto do álbum praticamente gira em torno de uma autoexaltação financeira pouco memorável e irrelevante a quem não é fã do casal. Ainda assim, é melhor que muitos projetos do mesmo gênero lançados em 2018 e prova que a Beyoncé sempre teve a capacidade de mandar alguns raps, mesmo que aqui falte sustância.
Cotação: mediano
Melhores música: “Apeshit”, “Boss”
Pior música: “713”
7° “I Am… Sasha Fierce”, 2008
O conceito do álbum, que representa um lado “Beyoncé” mais introspectivo e a corajosa alter ego “Sasha Fierce”, é interessante, mas não foi bem equilibrado. Aliás, ao discutir esse projeto é necessário perguntar: qual das várias versões estamos analisando?
Inicialmente projetado com 11 músicas, sendo seis no disco “I am” e cinco na parte “Sasha”, e 18 músicas na versão deluxe com oito faixas para cada lado, o projeto teve relançamentos que contam com até 20 músicas, remixes e um DVD. Este movimento pode ser interpretado como uma estratégia de marketing interessante, já que as músicas do “I Am… Sasha Fierce” deluxe poderiam ser acionadas caso as da versão principal não funcionassem com o público. Ou foi apenas uma tentativa de estender o sucesso da era (que é o quadro mais plausível, já que ela só acabou após quase dois anos com o single “Why Don’t You Love Me”).
Entretanto, os méritos artísticos de “I Am… Sasha Fierce” são apenas validados se levarmos em conta a versão completa. As baladas da seção “I Am” ou já eram insossas na época (como “Disappear”) ou envelheceram muito mal (como “Halo” e “If I Were a Boy”). A parte “Sasha Fierce”, com toda sua energia, também sofre com uma produção que não sobrevive tão bem aos tempos atuais, mas entrega clássicos upbeat (como “Single Ladies”) e momentos introspectivos que são melhores do que os da seção “I Am” ( como “Scared of Lonely” e “Hello”). Resumo da história: foi uma era icônica, mas o álbum nem tanto assim.
Cotação: mediano
Melhores músicas: “Sweet Dreams”, “Radio”, “Hello”, “Broken-Hearted Girl”, “Diva”, “Ego”
Piores músicas: “Smash Into You”, “That’s Why You’re Beautiful”, “Video Phone (solo)”
6° “Dangerously In Love”, 2003
Longe de ser um clássico, mas também distante de ser ruim, “Dangerously In Love” segue a fórmula tradicional de vários álbuns de estreia de artista pop: junta uns três ou quatro singles bons e enche o resto do CD com o que der. Por ter envelhecido melhor do que o “I Am… Sasha Fierce”, ele aparece uma posição acima, mas sofre da mesma falta de concisão.
Com “Crazy In Love” e “Baby Boy”, é difícil que a gente reprove por inteiro o “Dangerously In Love” mesmo quando ele joga na nossa cara fillers como “Hip Hop Star” e “That’s How You Like It”. Também é o trabalho em que mais vemos Beyoncé cantando r&b contemporâneo e pop soul em toda a sua carreira, como as joias subestimadas ‘Speechless” e “Be With You”.
Cotação: bom
Melhores músicas: “Crazy In Love”, “Baby Boy”, “Naughty Girl”, “Speechless”, “Be With You”, “Me, Myself and I”
Piores músicas: “Signs (feat. Missy Elliott)”, “That’s How You Like It” (feat. Jay Z), Hip Hop Star (feat. Big Boi & Sleepy Brown)
5° “The Lion King: The Gift”, 2019
Não tem jeito: o álbum inspirado no filme “Rei Leão” (2019) é o mais injustiçado de Beyoncé. Em “The Gift”, a cantora não só conseguiu inserir uma narrativa que se conectasse com o filme “Rei Leão”, como também trouxe elementos que se relacionam com as suas histórias pessoais, como o trecho em que revela “tentar ser uma boa esposa” na canção “Bigger”.
A curadoria de sonoridades e a lista de colaboradores do “The Gift” é praticamente perfeita e repleta de colaborações que “zeram” a listinha de artistas da África Subsaariana “a se conhecer”. Com Burna Boy, Busiswa, Yemi Alade, Tiwa Savage (e até créditos de composição para a rainha da Afro-House, Niniola), o projeto é completamente honesto com o que se toca no continente sem soar como uma apropriação barata.
Cotação: excelente
Melhores músicas: “Already (feat. Shatta Wale & Major Lazer)”, “Nile (feat. Kendrick Lamar)”, “Brown Skin Girl (feat. Saint Jhn, Wizkid & Blue Ivy Carter)”, “Bigger”, “My Power (feat. Nija, Busiswa, Yemi Alade, Tierra Whack, Moonchild Sanelly & DJ Lag)”, “Find Your Way Back”, “Otherside”, “Don’t Jealous Me (feat. Tekno, Lord Afrixana, Yemi Alade & Mr Eazi), “Keys to the Kingdom (cantada por Tiwa Savage & Mr Eazi) “, “Ja Ara E (cantada pelo Burna Boy)”, “Mood 4 Eva (feat. Jay-Z, Childish Gambino & Oumou Sangaré)”
Pior música: “SCAR (cantada por 070 Shake and Jessie Reyez)”
4° “B’day”, 2006
Produzido em meio à participação de Beyoncé no filme “Dreamgirls”, “B’Day” é um álbum pop quase sem skips. Quem ouve pensa que a intenção dele era evitar que a cantora tivesse qualquer chance de conhecer o fracasso logo em seu segundo álbum (e parabéns, conseguiu). Houve tanto esforço nessa era que hoje os fãs reconhecem o “B’day” como o “primeiro álbum visual” de Beyoncé, já que quase todas as faixas ganharam clipe.
Da balada ultra reproduzida “Irreplaceable” aos seis minutos da dançante “Get Me Bodied”, “B’Day” tem uma produção vibrante do início ao fim e prova que não é necessário um grande conceito para fazer um álbum memorável.
Cotação: clássico
Melhores músicas: “Upgrade U” e “Deja Vu” (ambas com Jay Z), “Get Me Bodied” (se você tiver a versão extendida), “Ring The Alarm”, “Freakum Dress”, “Green Light”, “Suga Mama”, “Listen”, “Irreplaceable”, “Check on It” (se a sua versão tiver)
Pior música: “Resentment”
3° “Beyoncé”, 2013
O que você estava fazendo naquele 13 de dezembro de 2013? Como reconhecido pela própria Beyoncé em “Feeling Myself” (2014), dueto com Nicki Minaj, ela realmente “parou o mundo com aquele lançamento digital”.
Durante a manhã, acordávamos com a informação de que a cantora tinha publicado um álbum de forma surpresa com videoclipes para cada faixa. Era um mundo em que era praticamente impensável lançar um projeto desse tipo do nada, sem o esquema tradicional de singles em espaços de um a dois meses para então lançar um CD completo. Os banners do então popular Itunes estampavam apenas fotos de promoção ao projeto autointitulado (algo pouco usual na época). Foi um dia apocalíptico para a música pop – e, em especial, para alguns fãs que procuravam formas de driblar a pobreza para conseguir ouvir o projeto (história própria).
“Beyoncé” ajudou a recriar a cultura do álbum no mainstream, popularizou os lançamentos surpresa e até teria ajudado a padronizar o dia em que saem músicas novas para a sexta. Com tantos feitos, até parece que a arte em si é secundária, mas não é bem assim. Em “Flawless***” – e com a ajuda do discurso da escritora nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie – Beyoncé viralizava a frase “i woke up like this” e apresentava de forma mais incisiva as ideias feministas que sempre defendeu. Em momentos como “Rocket”, “Partition” e “Drunk in Love”, a cantora mostrou que a maternidade não pode ser um impedimento para que as mulheres continuem se sentindo sensuais e felizes com os seus corpos. Entre tantas coisas, “Beyoncé” é um caldeirão de ideias que mostrou ao mundo que a cantora poderia alçar voos ainda mais altos com a sua música.
Cotação: clássico
Melhores músicas: “Haunted”, “Drunk In Love (feat. Jay Z)”, “Blow”, “Partition”, “Jealous”, “Mine (ft. Drake)”, “Flawless*** (feat. Chimamanda Ngozi Adiche), “Blue (feat. Blue Ivy)
Piores músicas (ou “menos melhores”): “XO”, “Superpower (feat. Frank Ocean)”
2° “4”, 2011
O hiato de Beyoncé após a era “I Am… Sasha Fierce” foi crucial para a mudança drástica em seus rumos artísticos. Durante essa época, Beyoncé rachou profissionalmente com o seu empresário e pai, Matthew Knowles, teve um aborto que a devastou emocionalmente e se mostrou muito infeliz com os padrões musicais das rádios do momento. Toda essa insatisfação pessoal fez com que surgisse o “4”, seu álbum mais orgânico e sincero até hoje.
Por ser menos “desesperado” em vender, o álbum também foi o ponto em que Beyoncé finalmente seria confrontada com a sensação de fracasso (se é que isso existiu em algum momento), tornando-se fundamental para a evolução dela nos projetos seguintes. “Run The World (Girls)” foi um primeiro single que hoje se mostra maior do que realmente foi, já que teve resultados decepcionantes nas paradas musicais, como o pico na posição 29 na Billboard Hot 100. Um vazamento semanas antes do lançamento oficial do “4” também não ajudaria a fazer com que as coisas melhorassem.
A verdade é que, quando as músicas saíram, nós vimos uma Beyoncé muito mais serena e que já passava a sensação de que a ansiedade de seguir certos padrões não era mais tão grande. Entre as dilacerantes “I Care” e “Rather Die Young”, a cantora apresentou no “4” as suas melhores baladas e alguns dos momentos dançantes mais genuínos dela desde sempre, como “Love On Top” e a africanizada “End of Time”. De forma ainda mais especial, a turbulenta “Countdown” segue sendo uma das produções mais originais e brilhantes do mundo pop até hoje. Assim como nas melhores coisas da vida, parece que quem escolhe a gente nessa situação é o álbum – e não o contrário.
Cotação: clássico
Melhores músicas: “1+1”, “I Care”, “I Miss You”, “Party (feat. André 3000 & Kanye West), “Rather Die Young”, “Start Over”, “Love On Top”, “Countdown”, “End Of Time”, e dependendo da sua versão, “Lay Up Under Me”, “Schoolin’ Life”, “Dance For You” e “Dreaming”
Piores músicas (ou “menos melhores”): er… nenhuma
1° “Lemonade”, 2016
Após um acontecimento tão importante como o lançamento do álbum “Beyoncé” (2013), era inevitável pensar: qual será o próximo passo? Os mais exigentes (como nós) poderiam perceber que o “autointitulado” era um grande avanço, mas ainda não era a obra-prima final da cantora – e no fim estávamos certos.
Assim como em “Beyoncé”, “Lemonade” caiu como uma bomba no mainstream mundial, mas por motivos diferentes. Apesar de ter a mesma pegada instantânea e visual do projeto anterior, aqui Beyoncé se preocupou mais em criar uma narrativa coesa que pudesse falar sobre a traição sofrida em seu casamento. Como as entrevistas de Beyoncé foram (e continuam) se tornando cada vez mais raras, só com o “Lemonade” o mundo descobriu a infidelidade de Jay Z com bons detalhes e o que foi feito depois.
O projeto narra de forma harmônica todos os estágios passados por Beyoncé nesta situação: a negação (“Pray You Catch Me”), a paranoia (“Hold Up”), a raiva (“Don’t Hurt Yourself”), o desdém (“Sorry”), o sarar das feridas ( “Love Drought”, “Sandcastles”) e a reconciliação (“All Night”). As diferentes fases também representaram diferentes sonoridades, sendo algumas delas inéditas para a cantora, como o blues rock e o country soul. Aqui também vimos uma “Beyoncé rapper” mais confiante do que nunca (“quando ele me fode bem, eu o levo no Red Lobster”), como no single “Formation”, que já é uma das declarações musicais de orgulho racial mais memoráveis do século 21.
“Lemonade” é o melhor álbum de Beyoncé pois é uma união de tudo que faz a cantora ser o ícone que é: tem a alma e honestidade dos bons momentos de “Dangerously In Love” e “4”, a assertividade do “B’day” e a ambição do álbum autointitulado, mas com aspirações ainda maiores. Para a nossa sorte, “Lemonade” também soa mais como uma história bem contada do que a última grande obra de Beyoncé. Que assim seja!
Cotação: clássico
Melhores músicas: “Pray You Catch Me”, “Hold Up”, “Don’t Hurt Yourself (feat. Jack White)”, “Sorry”, “6 Inch (feat. The Weeknd)”, “Daddy Lessons”, “Love Drought”, “Sandcastles”, “Freedom (feat. Kendrick Lamar)”, “All Night”, “Formation”
Piores músicas (ou “menos melhores”): “Forward (feat. James Blake)”
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