Vivendo o auge de sua carreira, Ariana Grande não surpreende ao ter sido o primeiro nome cotado no remake do filme “As Panteras” (Charlie’s Angels, 2019) para uma colaboração musical. Assim como Scooter Braun e Savan Kotecha, a cantora foi selecionada para ser a produtora executiva da trilha sonora do longa. Mas não se engane: a escolha de Ariana para capitanear esse projeto levou em conta muito mais do que seus hits e números expressivos. Mesmo que “7 rings” toque incansavelmente em todos os cantos do planeta, Ariana combina perfeitamente com o arquétipo que o filme promove: mulheres seguras, inteligentes e ávidas conhecedoras de sua sensualidade.
O problema é que, em tempos de trilhas encorpadas como “The Gift” e “Black Panther”, “Charlie’s Angels” no máximo emula o formato de uma coletânea musical de Copa do Mundo. Não me entenda mal (até porque amo álbum de Copa), mas se em produções desse tipo todas as músicas envolvem temas relacionados ao futebol e ao ato de torcer (ainda que com um bom contexto cultural do país-sede da competição),“Charlie’s Angels” vive em um looping de canções que rondam o empoderamento feminino de forma nem sempre instigante ou inspirada, mudando um aspecto na produção aqui, outro ali. A lógica realmente é similar aos projetos musicais da FIFA: varia um pouco o tema central do projeto, junta todo mundo numa música e vê no que dá. E claro, não esqueça dos remixes que absolutamente ninguém pediu (como “Bad Girls”, de Donna Summer, remixada por Gigamesh).
“Don’t Call Me Angel”, primeiro single do projeto, resume bem esse problema, já que promove uma parceria de química questionável entre Ariana, Miley Cyrus e Lana Del Rey — grandes nomes com repertórios muito diferentes— que acaba funcionando por conta do beat recheado com uma espécie de sino e pela letra bem estruturada para ficar na sua memória pelo resto do ano. A bem da verdade, a única posição imutável nesse trio aleatório é a de Ariana, já que as outras duas cantoras poderiam ter sido substituídas por qualquer outro nome que formasse a cota “pop” ou“pop alternativo”. O “padrão FIFA” se repete com a tropical “Bad To You”, união entre Ariana, Normani e Nicki Minaj, e “How it’s Done”, faixa enérgica que abre o projeto com Kash Doll, Kim Petras, Alma e Stefflon Don.
Contrariando as super parcerias, as músicas solo do álbum até conseguem se destacar mais em alguns aspectos, mas acabam parecendo pouco conectadas com a ideia geral do projeto. O trap “How i look on you”, melhor faixa no álbum, é uma canção confessional de Ariana com o DNA e qualidade de composição do “thank you, next” — mas que, infelizmente, acaba ilhada por destoar sonoramente das outras músicas. “Pantera”, performada por Anitta, apresenta o mesmo problema — agora por conta de sua produção latina e letra em português — mas acerta ao colocar a cantora brasileira para libertar a sua Rita Cadillac interna. Por outro lado, “Blackout”, canção de Danielle Bradbery, é o pior dos dois mundos: não combina com o flow do álbum e não tem nada de interessante, já que baladas como essa aparecem a todo momento em seletivas de Eurovision e versões do The Voice por todo o mundo quando o artista tenta impressionar a audiência a qualquer custo.
“Charlie’s Angels: Original Motion Picture Soundtrack” está longe de ter um material escandalosamente ruim, mas todo o potencial que ficou nas mãos dos produtores executivos acabou sendo pouco utilizado. Chaka Khan, visivelmente desinteressada ao falar sobre sua participação com Ariana Grande na faixa “Nobody”, pode de certa forma resumir o sentimento geral do projeto: é fofo, mas não vai mudar o mundo.
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