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Do clássico “All i want for Christmas is You” ao singelo “Новогодняя” de Ivan Dorn e Antoxa MC, é difícil pensar em um mercado fonográfico que não tenha apreço pelo feriado de Natal (ainda mais o estadunidense). E o que sobra para outras datas? Páscoa? Ação de Graças? Seguindo mais ou menos essa linha de raciocínio, Kim Petras, cantora pop alemã, lançou na última terça-feira “Turn off the light”, álbum que conta com dezessete faixas inspiradas no Halloween, sendo nove inéditas e o resto lançado no ano passado em uma mixtape.

Se neste início de carreira a cantora utilizou muito a imagem de “nova Barbie do pop”, bebendo de fontes como Spice Girls, Britney Spears e Charli XCX, digamos a verdade: Kim Petras é inegavelmente muito mais interessante no alter-ego fantasmagórico apresentado em “Turn off the Light”. Em cada uma das músicas, Kim soa como um espírito fadado a importunar o seu amante, tentando avisa-lo de que se apaixonar por ela não é nada fácil. Aliás, não querer se apaixonar também é um problema. Não tem escapatória.

Abusando da dance-pop e synthpop aos moldes da Italo disco feita nos anos 80, “Turn Off the Light” é uma festa autêntica que não para em segundo algum. É um projeto que soa como um set feito por aquele DJ chato que teima em remixar grandes sucessos quando, na verdade, todos querem ouvir a versão original. A diferença é que, em “Light”, a fórmula funciona pois todas as escolhas feitas na produção auxiliam na criação da atmosfera perfeita para o álbum. Se Kim tenta convocar o seu escolhido para um encontro e ele foge, podemos ouvir no início de “Wrong Turn” o som de um carro arrancando, e em seguida, capotando. Em outro exemplo, após uma canção chamada “Massacre”, podemos ouvir uma sequência de sons de espadas na faixa “Knives”, uma das oito músicas instrumentais do projeto.

Mesmo com um conceito bem fechado, “Turn off the light” encontra espaço para músicas que podem se destacar fora do contexto do Halloween. “Close your Eyes”, faixa que fez com que Kim Petras começasse a desenvolver outras músicas nessa temática, é um exemplo de pop perfection que só não entra em nossas listas de fim de ano por ser de 2018. Em uma das melhores pontes escritas nos últimos tempos, Kim esbraveja que “comerá o seu coração quando escurecer”, demonstrando assustadora segurança, personalidade, criatividade e boa performance até do ponto de vista vocal, que muitas vezes parece questionável neste álbum e em outras músicas. A trapzuda “Death by Sex”, eleita pelos fãs como o patinho feio da tracklist, não atrapalha a coesão do projeto e pode até angariar uma audiência nova que seja mais ligada nos últimos trabalhos de artistas como Ariana Grande, Drake e Post Malone.

O final do álbum revela uma carga pessoal mais forte, onde Kim abraça a morte e “parte para outra” de uma vez por todas. “Everybody Dies”, quase uma “Love on the brain” embebida em “Womanizer”, chama a atenção por trazer memórias pessoais e, até mesmo, possíveis vivências dela como mulher trans. Kim Petras desde cedo foi manchete de sites por todo o mundo ao ser retratada como “a transsexual mais jovem do mundo”, já que desde os doze anos faz tratamento de readequação hormonal, decisão que gerou polêmica em seu país, e isso pode ter sido relembrado aqui (tradução no link):

Mama’s gonna get a call one day
That her baby’s dead and gone away
I been knocking on Heaven’s door
Since the day that I was born
Yeah, since a young girl
Always knew that I was trouble
Livin’ like a loaded pistol
’Cause when you’re gone is when they miss ya

“Turn off the light” é uma agradável surpresa em um cenário estadunidense com alta demanda por renovação, mostrando que Kim Petras já sabe os fundamentos de um bom álbum pop e os carrega debaixo do braço. É repleto de características memoráveis, mesmo que fique a sensação de que ela poderia ter ido ainda mais longe em todos os âmbitos, mas… o que tem para hoje já é o suficiente.

Sobre o autor

Matheus Rodrigues

Jornalista formado em 2023 na Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Apaixonado por música, culturas diferentes, futebol e Coca Zero. Obcecado por Eurovision e pop do leste europeu. Torcedor do imenso Sport Club Internacional.
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