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Justin Bieber integra o rol de artistas masculinos (assim como Drake e Ed Sheeran), que já não precisam de muito esforço para ter um hit. Seus nomes são gigantes, e apenas estar nos créditos de uma canção já é o suficiente para alavancar uma música ao topo das paradas. Isto é um mérito deles (que fique bem claro), mas essa “gordura a queimar” com o público é importante para o crescimento de um artista no mainstream. Ela pode dar a coragem necessária para que apareçam músicas e álbuns que mudem o jogo – assim como Beyoncé fez em 2013 com o álbum autointitulado. Entretanto, o estofo também facilita a preguiça e a mesmice. Se qualquer coisa que sair da minha boca vai “hitar”, por que fazer esforço?  Este é um mal que atinge Justin Bieber em “Justice”, novo álbum do cantor canadense, lançado no dia 19 de março.

Justin parece ter ouvido as críticas negativas ao último projeto, “Changes”, e fez alterações substanciais. Se a produção do álbum anterior beirava o desagradável com o que parecia um mix de toques de celulares antigos, “Justice” é mais conectado às tendências nostálgicas que tem feito sucesso nas rádios, como o oitentista “After Hours” de The Weeknd. Se antes ele abusou de uma sonoridade enfadonha feita com trap e os toques de algum Nokia da década retrasada, agora o som dele é muito mais diverso e pop em sua essência (então não adianta reclamar se o Grammy indicar esse álbum nas categorias pop, viu?).

“Peaches”, atual single, é um acerto, e as participações de Daniel Caeser e Giveon harmonizam muito bem na proposta de r&b com pop. “Holy”, faixa em participação com Chance The Rapper, é uma canção de r&b contemporâneo e pegada gospel que serve como uma demonstração da devoção do cantor ao catolicismo, onde ele resgata um pouco das próprias raízes (ele aprendia sobre música na igreja), como também serve de carta de amor a sua esposa, Hailey Baldwin. Infelizmente não é suficientemente emocionante para cativar, e o rap do Chance também ajuda muito pouco (“when they get messy, go lefty like Lionel Messi”), mas é uma produção interessante e diferenciada no catálogo do cantor.

Em “Deserve You”, melhor faixa do álbum e 100% pop, Justin traz um sentimento quase semelhante à autossabotagem, relatando não sentir que merece a sua amada. Este é um dos momentos mais vulneráveis de Justin no álbum, mas isso nunca é feito de forma tão profunda ou pessoal, orbitando sempre no universo de amor à esposa, que se somar o álbum “Changes”, já deve ter umas 100 dedicatórias feitas pelo cantor. “Lonely” é o momento mais “gráfico” no projeto todo, onde Justin expõe a sensação de solidão por conta da fama, mas o refrão repetitivo e os vocais irritantes cortam todo o clima. Se tratando de vocais, Khalid, um dos cantores mais superestimados do mainstream atual, entrega nada além de um bom sonífero em “As i Am”, balada midtempo genérica e datada que facilmente poderia ser cortada do álbum.

Mesmo com esses e outros erros em “Justice”, o pior de todos não poderia deixar de ser a inserção dos discursos de Martin Luther King Jr. Um líder marcado pela luta contra a discriminação racial não merece ser usado como acessório em um álbum como este, tendo absolutamente nenhuma ligação com os temas de sua luta. Justin se defendeu dizendo que inseriu os discursos apenas pensando em amplificar a palavra do ativista para uma audiência maior, mas a forma como foi feita não deixa de ser de péssimo gosto. Por exemplo, em “MLK Interlude”, o discurso de Martin Luther King foi mal cortado (quando ele fala “Justice”, parece que fala “Justin”), dando início imediato a “Die For You”, música com Dominic Fike, em energia e temáticas completamente diferentes. Se o cantor realmente utilizou Martin Luther King Jr. para “enriquecer” o projeto e centralizar toda a luta do ativista em torno de uma narrativa pessoal, este é um dos atos mais egotistas e repugnantes que já vi na música pop desde que me entendo por gente. Vamos tentar acreditar nas boas intenções, mas por favor, da próxima vez posta esse discurso no Instagram, não no seu novo álbum.

Por fim, ao ouvir “Justice”, a sensação que fica é a de que Justin Bieber chegou ao seu pico criativo no álbum “Purpose” (projeto que o recolocou no mercado) e agora está como um barco à deriva em seu próprio sucesso, enchendo álbuns novos com músicas imemoráveis ou inofensivas. É preciso lembrar que o prestígio dele ainda é enorme, mas em algum momento os fãs vão precisar de algo a mais. Justin tem todos os recursos para mais uma vez lançar algo que demonstre a nós, meros comentaristas, que ele merece o protagonismo que tem no pop mundial – mas precisa querer, pois “Justice” não é uma boa prova disto.

Justin Bieber anuncia álbum 'Justice' para 19 de março e defende 'justiça para humanidade' | Música | G1

“Justice” – Justin Bieber

Ouça no Spotify

Kolibli Recomenda: “Deserve You”, “Peaches”, “Off My Face”

Piores músicas: “MLK Interlude”, “As i Am”, “Hold On”, “Die For You”

Leia também:

“Changes” é eleito o 2° pior álbum de 2020 // “Yummy” é eleita a pior música de 2020

Sobre o autor

Matheus Rodrigues

Jornalista formado em 2023 na Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Apaixonado por música, culturas diferentes, futebol e Coca Zero. Obcecado por Eurovision e pop do leste europeu. Torcedor do imenso Sport Club Internacional.
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3 thoughts on “Justin Bieber segue jornada de mediocridade em seu novo álbum, “Justice”

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